Relação Campo-Teoria
Nessa parte vamos relacionar o evento do Maracatu, projeto Calo na Mão, com os textos apresentados em aula de Identidade e Cultura.
Segundo Stuart Hall, teórico e sociólogo, a concepção de identidade pautada em um indivíduo unificado que nasce com uma identidade formada e permanece com ela de forma imutável até o final de sua vida está em declínio. Em seu livro “A identidade cultural na pós modernidade”, ele aborda que a sociedade moderna do século XX passou por intensas transformações estruturais que abalaram os quadros de referências que, por tanto tempo, proporcionaram uma estabilidade do sujeito no mundo social. Isso ocasionou a fragmentação do indivíduo e o surgimento de novos tipos de identidade. O indivíduo passa a construir sua identidade a partir de suas reflexões sobre si mesmo, ao longo de sua vida, influenciado por contextos diferentes, seja por meio de fatores sociais, políticos e também tecnológicos. Isso gera mudanças diretas na relação entre o sujeito e sua identidade, passando esta a ser fragmentada.
Há uma relação importante entre o texto e a ida ao Maracatu, já que esse surgiu a partir de uma miscigenação entre as culturas portuguesa, indígena e africana. O povo negro sempre teve dificuldade de se estabelecer como nação, já que teve sua identidade estilhaçada a partir da diáspora que se iniciou através do tráfico negreiro. Assim, os fluxos culturais, principalmente, no caso do Brasil criaram “identidades partilhadas”, culturais nacionais que sofreram infiltrações de outras culturas, contrariando a antiga tradição que via a identidade do homem de maneira unificada.
Além disso, o Maracatu é uma manifestação predominantemente regional, comum nos estados de Pernambuco, sobretudo nas cidades de Olinda, Recife e Nazaré da Mata. No entanto, quando trazida também para o estado de São Paulo –metrópole-, receberam influências urbanas, respeitando as tradicionais nações de maracatu, as rainhas, aos mestres e todos que carregaram e carregam essa tradição e ancestralidade e com estima a todos os grupos e seus brincantes, que fazem desta uma cultura viva e permanente. Assim como o sujeito pós moderno pode ser identificado por sua flexibilidade no contato com outras identidades culturais, as manifestações artísticas também podem ser vistas por meio de uma moldabilidade, uma vez que são passíveis de mudança- organização, personagens, ritmos- por diversas razões.
O professor e autor Petrônio Domingues afirma que “a cultura popular negra é um espaço ambivalente, paradoxal, local de intersecções, consentimentos, insurgências e contestações táticas”, ou seja, os repertórios culturais negros são influenciados por matrizes distintas, como por exemplo, é o caso do Maracatu, produto de fronteiras culturais- indígena, portuguesa e africana-, de negociações entre dominantes e subalternas, já que uma das hipóteses da origem do Maracatu é a de que ele teria surgido a partir das coroações e autos do Rei do Congo, prática implantada no Brasil supostamente pelos colonizadores portugueses e, por consequência, permitida pelos senhores de escravo. O Maracatu também pode ser tido como o fruto de recodificações e transcodificações, como é o caso do Maracatu do estado de São Paulo e o Maracatu do estado de Pernambuco. Portanto, a cultura popular é um processo plural, passível de mudanças, de criações e recriações, uma forma de dominação, ou até mesmo pelo contrário, como resistência a uma dominação.
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